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Cultura do alho abre oportunidades para produtores no Ceará

01 de abril de 2021

O alho é um dos temperos mais populares do mundo, especialmente no Brasil, onde o sabor que este produto confere aos pratos é bastante apreciado. Não é à toa que, em 2020, os brasileiros consumiram 380 mil toneladas de alho, ou seja, 1,7 kg por habitante. A demanda é também bastante aquecida pelos benefícios que a hortaliça traz à saúde: rica em vitaminas, sais minerais e aminoácidos, é expectorante, bactericida e ajuda no combate a doenças cardiovasculares. Como se não bastasse, a cultura do alho tem importante papel econômico e social, por ser intensiva em mão de obra.

Em outras palavras, o cenário é promissor para quem deseja se dedicar à sua produção. Ainda mais porque o País importa mais de 50% da quantidade de alho que consome. Desse modo, com mercado doméstico certo, o alho abre oportunidades para estados como o Ceará produzirem e fornecerem o produto nacional e até internacionalmente.

“O Ceará, que já chegou a ter alguma produção, se encontra entre o Piauí e o Rio Grande do Norte, dois estados do Nordeste que já vêm apostando na cultura do alho e obtendo sucesso em um território com clima e solo similares ao nosso. Daí a ideia de voltar a produzir aqui também, pois é uma cultura intensiva em mão de obra, empregando de quatro a seis pessoas por hectare, portanto, importante para a geração de emprego e renda no campo. E seu cultivo pode ser feito tanto pelo agricultor familiar, como por pequenos e grandes produtores”

Erildo Pontes, coordenador de Recursos Hídricos para o Agronegócio da Sedet

De acordo com Erildo, além do alto consumo in natura, a industrialização do produto é outro fator que pode estimular a revitalização da cultura do alho no Ceará. “Produzir o alho no Estado também abre espaço para atrair indústrias de alimentos para perto dos produtores, desenvolvendo uma cadeia produtiva de alto valor agregado para o agronegócio cearense. Ou
seja, temos um grande mercado pela frente”, completa o coordenador de Recursos Hídricos para o Agronegócio da Secretaria Executiva do Agronegócio, da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Ceará (Sedet).

Até porque, lembra Pontes, as indústrias hoje já instaladas em território cearense que processam o alho, ou o tem com insumo para molhos e temperos, compram a hortaliça de outros estados. “Dessa forma, elas poderão comprar aqui, mais uma razão que mostra que não é difícil desenvolver a cultura do alho no Ceará”, justifica.

Ao mesmo tempo, afirma, as novas tecnologias têm possibilitado a adaptação de cultivares com maior valor comercial em várias regiões do semiárido, a um custo acessível e produtividade elevada, se houver dedicação do produtor e apoio de assistência técnica especializada.

Tecnologias aplicadas à cultura do alho

De fato, segundo expõe o engenheiro agrônomo Francisco Vilela Resende, especialista na cultura do alho e pesquisador da Embrapa Hortaliças do Distrito Federal, subsidiária da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), hoje já é possível produzir o condimento em boa parte do território nacional, incluindo o Nordeste, respeitando as condições e características existentes.

Isso ocorre especialmente devido à adoção da vernalização, ou frigorificação dos bulbos de alho em pré-plantio, “uma tecnologia capaz de tornar a planta menos exigente em fotoperíodo (duração do dia em relação à noite em um tempo de 24 horas) e temperaturas baixas, permitindo a diferenciação e forma.

Juntamente com a vernalização, emenda Resende, temos ainda as tecnologias de irrigação, como o gotejamento e a micro aspersão, “indicadas para regiões com poucos recursos hídricos, a exemplo do Ceará. Assim como também é possível fazer o controle de plantas invasoras, o que também garante a produtividade”, acrescenta.

Tecnologias aplicadas à cultura do alho

A professora e doutora em Fitotecnia Maria Zuleide de Negreiros, da Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa), é uma das pesquisadoras que desenvolve a implantação da cultura do alho no Rio Grande do Norte, em parceria com a Embrapa Hortaliças.

Segundo ela, a primeira fase do programa de revitalização dessa cultura em seu estado ocorreu entre os anos de 2012 e 2014, concentrando-se na avaliação de cultivares mais produtivas e com melhor aceitação de mercado, levando em consideração as peculiaridades da região, e nos ajustes da tecnologia de vernalização, ponto fundamental para adaptação de novas espécies às condições climáticas do Rio Grande do Norte.

Na segunda fase, de 2014 a 2018, emenda, foram aprimoradas as técnicas de vernalização, manejo e tratos culturais, cultivo do alho-semente livre de vírus e a introdução do alho em regiões serranas com altitudes acima de 500 metros, onde as condições climáticas são mais favoráveis ao cultivo do alho nobre.

“Os experimentos com o plantio de alho nobre em municípios serranos como Martins e Portalegre (720m e 620m de altitude, respectivamente), sem tradição de cultivo de alho, responderam de maneira bastante positiva às novas tecnologias, a exemplo da vernalização”

Maria Zuleide de Negreiros, doutora em Fitotecnia

Conforme disse Maria Zuleide, que também é professora da Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa), “as pesquisas, agora, estão focadas na tecnologia de multiplicação do alho-semente livre de vírus, assim como no estudo da vernalização a temperaturas negativas, tonando possível produzir o alho em regiões de baixa altitude e no semiárido”.

No mesmo caminho seguido pelo Rio Grande do Norte, embora em estágio mais avançado, o Piauí é outro estado do Nordeste brasileiro que vem desenvolvendo a cadeia produtiva do alho para fortalecer a sua economia. É o que conta José Airton Carvalho Dantas, produtor rural e presidente da Câmara Setorial do Alho do Piauí, que reúne 107 famílias produtoras em 21 municípios.

“O projeto no Piauí surgiu em 2015, quando buscamos orientação e obtivemos acesso às novas tecnologias com a Embrapa Hortaliças. Dessa forma, atualizamos o sistema de produção de alho no Estado, criando mecanismos para reduzir custos, incluindo a vernalização, adubação, sistemas de irrigação economizadores de água, como a micro aspersão e o gotejamento, o manejo fitossanitário e a introdução de cultivares livres de vírus. Assim como usamos telas protetoras nas áreas de cultivo”, relata.

Inicialmente, conta Dantas, o trabalho foi desenvolvido em cinco municípios piauienses, o que tem se expandido, agora, para várias localidades, ao passo que o Piauí vem aumentando o tamanho das áreas plantadas.

“Ao mesmo tempo, também estamos trabalhando em um programa de capacitação dos produtores, a fim de aumentar a produtividade, assim como estamos investindo no processamento e industrialização do alho, passando a comercializar o produto desidratado, em pó, em pasta e em conserva. Dessa forma, vamos conseguir sustentar a cadeia produtiva do alho no Piauí”

José Airton Carvalho Dantas, presidente da Câmara Setorial do Alho do Piauí

Perspectivas para a cultura do alho no Ceará

As experiências realizadas com sucesso no Nordeste, conclui Erildo Pontes, da Sedet, são importantes para mostrar que o Ceará pode se espelhar e motivar a revitalização da

no Estado, fortalecendo a presença do homem no campo e o desenvolvimento regional. “Temos que incentivar a introdução de culturas de maior valor agregado por hectare, a exemplo do alho, e que, além disso, consumam menos água e mais mão de obra, sendo capazes de gerar mais emprego e renda no campo”, afirma.

Como primeiros passos, expõe, “a ideia é promover eventos de capacitação, desenvolvendo, em seguida, um projeto piloto com um ou mais produtores comprometidos em levar adiante a cultura do alho no Ceará, com o apoio do Governo Estadual e acompanhamento de consultoria especializada”.

“A cultura do alho é extremamente importante, principalmente para os pequenos produtores e agricultores familiares. Devido ao alto valor agregado obtido por hectare, a hortaliça poderá representar a principal renda desse produtores. Isso vem dando uma base muito importante para manter os produtores no campo. Aliás, uma das grandes motivações da Anapa”

Rafael Jorge Corsino, presidente da Associação Nacional dos Produtores de Alho (Anapa)

Mercado de alho no Brasil

Dados da Anapa revelam que o consumo de alho no Brasil subiu de 30 milhões de caixas em 2019 para 36 milhões em 2020, um acréscimo de 20%. Já a produção, em igual período, cresceu cerca de 23%, saindo de 13,5 milhões de caixas em 2019 para 16,65 milhões de caixas em 2020.

Os principais produtores brasileiros são os estados de Minas Gerais (6.500 hectares plantados), Goiás (3.500 hectares cultivados), Santa Catarina (2.200 hectares) e Rio Grande do Sul (2.100 hectares). “Os estados do Piauí e Bahia, que também plantam alho ainda estão com áreas cultivadas inferiores a 1.000 hectares”, acrescenta Corsino.

Para complementar a demanda doméstica, o Brasil importou 19,35 milhões de caixas de alho em 2020, ante 16,5 milhões no ano anterior, ou seja, 17,2% a mais. Resumindo, expõe a Associação, o abastecimento nacional de alho no ano passado se deu com 46% provenientes da produção doméstica e 54% vindos do exterior. Para 2021, a expectativa é de que 56% da demanda brasileira seja abastecida pela safra nacional e 45% sejam importados.

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