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05 de junho de 2014

O processo de sucessão familiar em uma empresa agrícola não é simples. Muitos produtores rurais têm um grande desafio para encontrar o seu sucessor, pois em muitos casos os filhos não querem se envolver na gestão da fazenda. Em outros, um processo de sucessão deficiente pode culminar na divisão da família ou na impossibilidade de constituição de sociedade entre herdeiros.

O tema é preocupante, já que o desafio da produção de alimentos no longo prazo é enorme, sendo necessário, portanto, contarmos com uma produção agrícola sustentável e eficiente.

Em muitos países de grande potencial agrícola, podemos observar um aumento na idade média do produtor. Segundo o Global Census Reports, na maioria dos países considerados desenvolvidos no setor mais da metade dos produtores tem mais de 55 anos. Nos EUA, por exemplo, a taxa de produtores rurais com mais de 65 anos aumentou em 20% nos últimos cinco anos. No Brasil, temos um cenário um pouco mais otimista, com uma média de 30% de produtores com idade superior a 55 anos, indicando que a geração atual de agricultores ainda estará na “ativa” por muito tempo.

A agricultura é uma atividade volátil de ciclo longo, que cunhou o ditado “o olho do dono é que engorda o boi” (engorda mesmo!).  Portanto, é um setor que se beneficia por ser majoritariamente gerido por famílias que têm “apego” à atividade e mantêm a visão de longo prazo. Assim, a transferência de experiência entre gerações é fundamental: a sucessão na agricultura deve ser um processo e não um fato.

A vivência do fundador, que muitas vezes se estende por mais de 30 ciclos agrícolas, infelizmente não é transmitida no DNA. A única forma da geração seguinte se beneficiar e absorver essa experiência é possibilitando uma convivência estruturada das duas gerações na gestão e na tomada de decisões, mesmo com os desafios que podem surgir durante este processo.  A depender da idade que a segunda geração se junta à gestão, pode levar décadas até que de fato o bastão seja passado. Portanto, é recomendável que o processo seja conduzido de forma consciente e ativa.

Este período da “gestão conjunta” deve preparar não só os herdeiros para serem os futuros líderes, mas também a empresa para ser liderada por outra geração e para ser tornar uma sociedade. Idealmente, os descendentes interessados em trabalhar no negócio da família deveriam buscar alguma experiência de trabalho fora do negócio da família antes de se juntarem à operação agrícola para, não só adquirirem referências que possam ajudar no aprimoramento da gestão, mas como também para experimentarem a relação de subordinação em um ambiente não familiar.

Tal experiência favorece muito a separação de papéis de gestor, acionista e membro da família, que será requerida no futuro. No entanto, observamos que na maioria das vezes esta experiência prévia não acontece. Portanto recomendamos que haja cautela dobrada no processo de gestão conjunta.

Podemos identificar dois fatores críticos que influenciam a taxa de sucesso do processo: profissionalismo e comunicação. É preciso alinhar as expectativas de carreira do novo gestor, definir formalmente as suas responsabilidades e os critérios de remuneração. Já na empresa é preciso trazer as informações que muitas vezes ficam “na cabeça do fundador” para um formato acessível para a nova geração. Ou seja, investir na implementação de sistemas e controles, organizar a informação de forma que haja transparência de custos e de resultados, através da contabilidade gerencial, e implementar algumas estruturas de governança, como reuniões de alinhamento e de planejamento e avaliação de resultados.

Outro ponto relevante é que, definir a sucessão patrimonial, a estrutura jurídica societária, por si só não garante o futuro ou o sucesso da gestão conjunta.  Acordos prévios sobre a interface da família com a empresa, sobre os papéis a serem desempenhados por cada membro durante o processo e um plano de transferência da gestão são as ações que realmente ampliam as taxas de sucesso e que devem preceder acordos jurídicos.

Nossa recomendação para minimizar turbulências no processo de sucessão é que a geração atual e os futuros líderes do agronegócio estejam atentos para implementar as boas práticas de governança e gestão que mencionamos, que vêm sendo amplamente discutidas no setor, mas que o cenário agrícola tem resistido a adotar. Utilizar as boas práticas é essencial para que a passagem do bastão seja perfeita, para que não seja um fato, mas sim que venha a ocorrer depois de uma longa e harmoniosa corrida conjunta. Assim poderemos dizer que a sucessão foi um processo saudável, que contribuiu para a sustentabilidade da atividade e do negócio da família.

 

* Fabiana Ferreira Alves, gerente executiva responsável pela Consultoria do Rural Bank,Rabobank Brasil

Fonte: Souagro